Marcel Proust - Uma homenagem
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Foto do escritorGiovanna Thomaz

Marcel Proust - Uma homenagem

Uma homenagem, uma tatuagem

 



Depois de dois anos estudando na França, voltei pro Brasil e coloquei no corpo um livrinho e uma madeleine.⁣


Tatuei pra não perder. É que me deu vontade de gravar na pele, deixar exposto, em carne viva, a lembrança de um tempo que pra mim foi tão importante. Que nem quando a gente tira foto: querendo eternizar um momento, com medo de deixar ele virar pó de memória. Minhas tatuagens são como fotografias. Ela me servem de lembrete.

No pulso esquerdo tatuei uma madeleine, bolinho tradicional francês - tradicional mesmo, seria o equivalente ao nosso pão de queijo aqui no Brasil. Sempre que olho pra madeleine no meu pulso, me lembro da França.


Mas escolhi tatuar o bolinho por outro motivo também: A madeleine ficou famosa e eternizada na literatura francesa pelas palavras de Proust. Através de sua obra, a madeleine virou símbolo dos pequenos momentos da vida, que muitas vezes são os mais importantes. Símbolo das nossas memórias afetivas, de objetos que estão ligados as nossas histórias ou personalidades.


A passagem das madeleines que ficou famosa está no volume 1 da coleção “Em Busca do Tempo Perdido”, que se chama "No Caminho de Swann", eis aqui o famoso trecho:


“É assim com nosso passado. Trabalho perdido procurar evocá-lo, todos os esforços da nossa inteligência permanecem inúteis. Está ele oculto, fora de seu domínio e do seu alcance, em algum objeto material (na sensação que nos daria esse objeto material) que nós nem suspeitamos. Esse objeto, só de acaso depende que o encontremos antes de morrer, ou que não encontremos nunca.
Muitos anos fazia que, de Combray, tudo quanto não fosse o teatro e o drama do meu deitar não mais existia para mim, quando, por um dia inverno, ao voltar para casa, vendo minha mãe que eu tinha frio, ofereceu-me chá, coisa que era contra os meus hábitos. A princípio recusei, mas, não sei por quê, terminei aceitando. Ela mandou buscar um desses bolinhos pequenos e cheios chamados madalenas e que parecem moldados na vala estriada de uma concha de São Tiago. Em breve, maquinalmente, acabrunhado com aquele triste dia e a perspectiva de mais um dia tão sombrio como o primeiro, levei aos lábios uma colherada de chá onde deixara amolecer um pedaço de madalena.
Mas no mesmo instante em que aquele gole, de envolta com as migalhas do bolo, tocou o meu paladar, estremeci, atento ao que se passava de extraordinário em mim. Invadira-me um prazer delicioso, isolado, sem noção da sua causa. Esse prazer logo me tornara indiferentes as vicissitudes da vida, inofensivos os seus desastres, ilusória a sua brevidade, tal como o faz o amor, enchendo-me de uma preciosa essência: ou antes, essa essência não estava em mim; era eu mesmo. Cessava de me sentir medíocre, contingente, mortal.
De onde me teria vindo aquela poderosa alegria? Senti que estava ligado ao gosto do chá e do bolo, mas que o ultrapassava infinitamente e não devia ser da mesma natureza. De onde vinha? Que significava? Onde aprendê-la? Bebo um segundo gole em que não encontro nada demais que no primeiro, um terceiro que me traz um pouco menos que o segundo. É tempo de parar, parece que está diminuindo a virtude da bebida. É claro que a verdade que procuro não está nela, mas em mim.
A bebida a despertou, mas não a conhece, e só o que pode fazer é repetir indefinidamente, cada vez com menos força, esse mesmo testemunho que não sei interpretar e que quero tornar a solicitar-lhe daqui a um instante e encontrar intacto à minha disposição, para um esclarecimento decisivo. Deponho a taça e volto-me para o meu espírito. É a ele que compete achar a verdade. Mas como? Grave incerteza todas as vezes em que o espírito se sente ultrapassado por si mesmo, quando ele, o explorador, é ao mesmo tempo o país obscuro a explorar e onde todo o seu equipamento de nada lhe servirá. Explorar? Não apenas explorar: criar. Está em face de qualquer coisa que ainda não existe e a que só ele pode dar realidade e fazer entrar na sua luz…”

PROUST, Marcel. Em Busca do Tempo Perdido. Volume 1. No Caminho de Swann. São Paulo: Globo, 2006. Págs. 71 e 72.


No pulso direito, tatuei um livro - símbolo da minha maior paixão, a literatura. Os livros me acompanham desde sempre e vão seguir me acompanhando sempre, agora também na pele.


Gosto muito de olhar pra eles - o livro e a madeleine - minha homenagem pessoal ao que vivi na França, às boas memórias, aos livros que amo, à literatura, - e claro - ao Proust.



 

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